Povo chileno confirma fracasso do Estado liberal na Constituinte
Pelo menos 18 dos 30 países da América Latina e Leste europeu que privatizaram a previdência social de 1981 até 2014, incentivados por organismos internacionais, como o FMI e o Banco Mundial, voltaram atrás e restabeleceram a previdência pública. O Chile deve entrar nesta lista até o final do ano.
No dia 4 de julho, a Constituinte do país vizinho, formada por representantes eleitos, incluindo representantes dos povos indígenas, aprovou uma nova Constituição. Para começar a valer, a Carta Magna ainda precisará ser aprovada em plebiscito nacional, que acontecerá em setembro.
O ponto sobre a previdência pública está entre os mais comentados naquele país. O Chile privatizou o sistema de aposentadorias em plena ditadura de Augusto Pinochet. Desde então, “a contribuição dos empregadores foi abolida e os trabalhadores passaram a ser obrigados a contribuir individualmente para uma Administradora de Fundos de Pensão (AFP) privada, que cobra altas taxas de administração e devolve benefícios irrisórios”, explicou o ex-diretor de Seguridade da Previ, o fundo de pensão fechado dos funcionários do Banco do Brasil, José Ricardo Sasseron, em artigo publicado na Rede Brasil Atual.
Perversidade
Em 2019, a Organização Internacional do Trabalho (OIT) divulgou o artigo “Reversão da Privatização da Previdência: Questões chaves”, onde defendeu o fortalecimento dos sistemas públicos de aposentadoria. No mesmo ano, o governo Bolsonaro entregou à Câmara dos Deputados sua proposta para reformar a previdência social, contendo um plano de “regime de capitalização” semelhante ao do Chile. Os parlamentares, porém, excluíram a medida do pacote de reformas à Previdência, aprovado em novembro daquele mesmo ano.
Enquanto lutava para fazer passar o regime de capitalização no Congresso, o ministro da Economia, Paulo Guedes, disse que o sistema previdenciário brasileiro, de base solidária, era responsável pela “perversidade” da desigualdade no país. O relatório da OIT, por outro lado, apontou que o setor financeiro é o único beneficiado nos países onde a previdência foi privatizada. “O uso de fundos de previdência para investimento público nacional, em geral, se perdeu nos sistemas privatizados de capitalização, que investiram as poupanças individuais em mercados de capitais buscando retornos elevados, sem colocar as metas nacionais de desenvolvimento como prioridade”, afirma o relatório.
A entidade mostrou ainda que, entre a população, houve aumento da desigualdade de renda, além de novas e maiores pressões fiscais, nos países que fizeram a transição da previdência social para a privada. “Como a aposentadoria privada é resultado de poupança pessoal, as pessoas de baixa renda ou que tiveram sua vida profissional interrompida, por exemplo, por causa da maternidade e das responsabilidades familiares, obtiveram poupanças muito reduzidas e consequentemente terminaram com aposentadorias baixas, aumentando assim as desigualdades”, explica o texto.
O quadro chileno
Atualmente, 60% dos chilenos não conseguem acumular o suficiente para se aposentar pelas administradoras de fundos, que cobram pesadas taxas de administração. E dos que conseguem, 80% recebem menos de um salário mínimo e 45% vivem abaixo da linha da pobreza. Para completar o desastre do liberalismo de Estado, apenas seis administradoras monopolizam o mercado de previdência no Chile – três delas de capital estadunidense, que controlam 75% do mercado. Essas entidades ainda investem quase 50% de toda a poupança dos trabalhadores chilenos fora do país, em empresas da Europa, Estados Unidos e Canadá. “A pobreza do idoso chileno paga a festa do capital financeiro internacional”, pontuou Sasseron.
Como documentou a OIT, a previdência privada tem baixo desempenho e os resultados desastrosos desse sistema ensina os governos que pretendem melhorar suas políticas nacionais de previdência. “A responsabilidade dos Estados de garantir a segurança de renda na idade avançada é melhor cumprida por meio do fortalecimento de sistemas públicos de previdência”, concluiu a entidade em seu relatório.
Assim, todos os dados apontam que o plebiscito que acontecerá em setembro no Chile abre nova possibilidade para uma previdência segura e que garanta o futuro da população naquele país.