PEC dos Precatórios, um instrumento para Bolsonaro tentar se reeleger em 2022
A articulação de Bolsonaro para conseguir aprovar a proposta de emenda à Constituição dos Precatórios (PEC nº23) no Congresso pode ser considerada a pavimentação do caminho para facilitar sua corrida no processo eleitoral em 2022.
O pacote, já aprovado em duas votações na Câmara dos Deputados, primeiro por 312 votos favoráveis e 144 contrários e, depois, por 323 a 172, agora segue para o Senado, onde também precisará da aprovação de três quintos (49) dos parlamentares, após dois turnos de discussão.
Por que a PEC dos Precatórios é tão importante para Bolsonaro? O pacote abre um espaço de R$ 91,6 bilhões no Orçamento de 2022 – ano eleitoral. E, caso seja aprovada pelo Senado ainda este ano, a Proposta também permitirá aumento de R$ 15 bilhões no teto de gastos até o final de 2021.
Esses valores para o governo gastar surgem porque a PEC 23 parcela o pagamento de precatórios e muda o cálculo do teto de gastos adicionais para o próximo ano. Precatórios são ordens de pagamento, reconhecidas pela Justiça, de indenizações que a União deve a pessoas (físicas e jurídicas) que processaram o Estado.
Além de parcelar o pagamento de precatórios, a PEC 23 traz uma emenda, aprovada na comissão especial da Câmara, que mudou a fórmula do teto de gastos. Até agora, o teto era baseado no limite de 2016, corrigido anualmente pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) acumulado entre julho de um ano e junho do ano seguinte. Com a emenda incluída na PEC 23, o teto passará a ser corrigido pela inflação de janeiro a dezembro do ano anterior.
“Aqui vale destacar que essa mudança da PEC, em que o IPCA passa a ser o índice acumulado entre janeiro e dezembro é ‘totalmente casuística’, segundo técnicos do próprio Congresso. Em outras palavras, ela foi pensada apenas para permitir gastos extras no próximo ano. Em 2023, por exemplo, não há nenhuma garantia de que esse cálculo será mais vantajoso para a União, podendo até provocar aperto nos orçamentos dos anos seguintes”, explicou o secretário de Relações de Trabalho da Confederação Nacional dos Trabalhadores do Ramo Financeiro (Contraf-CUT), Jeferson Meira, o Jefão.
STF frusta parte dos planos de Bolsonaro
O governo Bolsonaro disse que o aumento de recursos no orçamento de 2022 seria para financiar as despesas do Auxílio Brasil, programa criado por Bolsonaro, após acabar com o Bolsa Família, e para a compra de vacinas. Mas os recursos liberados com a PEC também poderiam ser direcionados para inflar o fundo eleitoral e nos pagamentos das emendas de relator, conhecidas como “orçamento secreto”, pela falta de transparência na execução dos recursos.
A partir de uma ação no Supremo Tribunal Federal, os planos de Bolsonaro para direcionar recursos para o “orçamento secreto” foram frustrados. Por 8 votos a 2, o colegiado do STF manteve a decisão da ministra Rosa Weber de suspender as emendas de relator.
“Ficamos felizes com a decisão do STF. Entretanto, com essa PEC, mais uma vez, Bolsonaro e seus líderes na Câmara passam por cima da Constituição e dos regimentos, com o objetivo de ludibriar a população”, observou Jefão, ao se referir as duas manobras que o presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), realizou na votação do primeiro turno para garantir a aprovação do texto. Primeiro, ele permitiu que os deputados em missão oficial votassem à distância e, segundo, realizou no plenário uma mudança no relatório sem que as alterações tivessem passado pela comissão especial da PEC.
Instabilidade para os mais pobres
Em entrevista ao portal Bancários Jundiaí, o diretor técnico do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese), Fausto Augusto Junior, avaliou que a PEC 23 atrai ainda mais instabilidade à economia brasileira, ao consolidar o calote do governo federal às pessoas que ganharam na justiça o direito à indenização do Estado.
“Estamos assistindo uma série de movimentos que só atraem mais instabilidade, como não pagar as próprias dívidas. Tudo isso sem discutir a questão dos juros, sem enfrentar o problema e só contendo os gastos sociais. O governo tira dos pobres, depois tenta colocar o cobertor curto sobre eles”, criticou.
O diretor técnico do Dieese também chamou atenção para a insegurança do programa Auxílio Brasil que, sem a PEC dos Precatórios, deixaria de existir por falta de financiamento: “Com o novo programa [social do governo] a desburocratização acabou e há incertezas sobre a distribuição. Estamos falando de famílias pobres, que têm dificuldades diversas, e deveriam ter mais facilidade para chegar à assistência social”, alertou.
Jeferson Meira completou a avaliação, destacando que “Bolsonaro acabou com o Bolsa Família criando o chamado ‘Auxílio Brasil’ com o objetivo de destruir toda a história de 18 anos de um programa social que deu certo e foi reconhecido mundialmente pelo combate à pobreza”, completando: “Essa descaracterização do programa social – junto ao anúncio de 20% no aumento do valor do auxílio, que só conseguirá ser pago com a aprovação da PEC no Congresso, porque seu governo foi incapaz de melhorar a economia no país –, comprova o caráter puramente eleitoreiro, na tentativa de atrair a simpatia daqueles que precisam do benefício, em um ano onde o presidente tenta a reeleição com índices delicados na aprovação do seu governo”, concluiu.