O que aprendemos com o caso Maurício Souza, desligado do Minas Tênis?

Em pouco mais de três semanas, manifestações em favor da população LGBTQIA+ foram responsáveis pelo afastamento e, em seguida, desligamento do jogador de vôlei Maurício Souza do Minas Tênis Clube. Por meio de uma publicação na sua conta do Instagram, feita no dia 12 de outubro, o atleta havia criticado o novo Superman, filho de Clark Kent, pela bissexualidade do personagem em quadrinhos.

Não era a primeira vez que o jogador usava a rede social para propagar mensagens de intolerância. Ele já havia feito publicações contra políticas de diversidade adotadas pela OAB-Pernambuco e Rede Globo. Maurício Souza também é apoiador declarado do governo Bolsonaro, com direito a fotos tiradas junto ao político que coleciona ataques à população LGBTQIA+.

“A avaliação que faço, da mobilização social que levou ao desligamento do jogador do Minas Tênis, é uma sinalização da compreensão da sociedade em reagir ao retrocesso”, ponderou Adilson Barros, diretor da Confederação Nacional dos Trabalhadores do Ramos Financeiro (Contraf-CUT) e militante do movimento LGBTQIA+. “[Essa mobilização] tem importância e relevância, dado o contexto em que vivemos. Estamos comemorando a saída do jogador, porém, de olhos abertos e atentos. Existe uma onda conservadora muito antes deste episódio”, completou.

Com a repercussão negativa das falas de Maurício Souza, inicialmente, o Minas Tênis afastou o atleta. As patrocinadoras, Gerdau e Fiat, pressionavam o time por uma retratação do jogador. “Por trás da iniciativa dessas empresas, está também o papel do chamado ‘pink money’ ou ‘dinheiro rosa’, termo que descreve o poder de compra da comunidade LGBTQIA+”, observou Adilson Barros.

No dia 26 de outubro, Maurício divulgou um singelo pedido de desculpas, mas no Twitter, onde contava apenas com 50 seguidores e não no Instagram, onde originalmente fez a postagem homofóbica e contava com cerca de 300 mil seguidores. Finalmente, no dia seguinte, 27 de outubro, o Minas Tênis anunciou o desligamento do jogador.

O diretor da Contraf-CUT avaliou que o episódio em si, do jogador Maurício, foi uma mostra do impacto do bolsonarismo na sociedade: “A instituição desse governo deu uma espécie de autoridade para pessoas como ele [Maurício] mostrarem as garras ‘em nome da moral e dos bons costumes’. Mas nós soubemos reagir rapidamente, juntamente com os formadores de opinião e de pessoas ligadas na defesa dos direitos humanos. Toda essa reação também nos deu a certeza que não estamos sozinhos nesse bom combate”, destacou, completando que “as redes sociais não vivem apenas de fake news” e que esses espaços de comunicação “continuam sendo importantes instrumentos de luta e mobilização para barrar o conservadorismo.”

Acolhimento no esporte

Recentemente, o jogador australiano de futebol Josh Cavallo revelou ser homossexual. “Há algo pessoal que preciso compartilhar com todos. Sou jogador de futebol e sou gay”, declarou em vídeo.  “Ao crescer, sempre senti a necessidade de esconder quem eu era porque tinha vergonha, vergonha de nunca poder fazer o que amo porque sou gay. Senti que tinha que esconder quem eu era para perseguir um sonho que sempre quis, desde criança. É cansativo e eu não gostaria que ninguém passasse por isso”, acrescentou.

Apesar do medo, Cavallo finalmente teve coragem de se posicionar publicamente e contou, emocionado, como foi a reação de amigos, familiares e colegas de profissão: “Eles têm sido incríveis. A resposta e o apoio que recebi são imensos”.

Aqui no Brasil, alguns esportistas de peso se declaram LGBTQIA+, entre eles Marta, Tifany Abreu, Diego Hypolito e Douglas Souza. Este último atleta atuou ao lado de Maurício Souza na seleção brasileira. Diante do comentário homofóbico do colega, ele publicou na sua conta do Instagram: “Se uma imagem como essa te preocupa, sinto muito, mas eu tenho uma novidade pra sua heterossexualidade frágil”.

Em entrevista ao canal do YouTube Põe Na Roda, Douglas contou que sua descoberta como homem gay foi algo natural: “Nunca escondi de ninguém, da diretoria do clube, dos companheiros de equipe”, revelou. “Mas ainda têm muitas pessoas com esse medo, esse receio [de sair do armário], que é totalmente natural. A gente sabe como nosso país é preconceituoso e homofóbico. Então é um medo justificável”, pontuou.

Infelizmente o Brasil ainda mantém altos índices de mortes e ataques contra LGBTs. De acordo com a Rede Trans Brasil, a expectativa de vida de uma pessoa trans é de 35 anos. Em média, a cada 26 horas, uma delas é assassinada no país. Já, de acordo com o Grupo Gay da Bahia (GGB), a cada 19 horas uma pessoa LGBT é morta no Brasil.

“Bolsonaro tem total responsabilidade por esse cenário. Como chefe maior da nação, ele deveria dar continuidade às políticas públicas deixadas pelos governos anteriores, que mantiveram programas eficazes, inclusive dando igualdade de oportunidade às populações LGBTQIA+”, concluiu Adilson Barros.