No Dia Mundial da Água brasileiro deve abrir os olhos para o hidronegócio

Nesta terça-feira, 22 de março, comemora-se o Dia Mundial da Água, instituído aqui no Brasil, em 1992, na Conferência das Nações Unidas, Rio 92, através da Resolução A/RES/47/193. A intenção da Organização das Nações Unidas (ONU) era criar uma comemoração anual que levasse à reflexão sobre a importância da água, conscientizando a população de que ela é um recurso que acaba, que evitar sua escassez e sua perda de qualidade são grandes desafios a serem enfrentado pela humanidade, se ela quiser garantir seu futuro.

Um dos eventos que marca o Dia Mundial da Água é a abertura da 9ª edição do Fórum Mundial da Água (9° WWW), que este ano acontece entre os dias 22 e 27 de março, em Dakar, no Senegal, e reunirá corporações interessadas na comercialização da água aliadas a governos menos progressistas, que tratam dos bens públicos como ativos econômicos.

Ao mesmo tempo realiza-se o Fórum Alternativo Mundial da Água (Fama), que defende os princípios adotados pelas Nações Unidas, que reconhece a água como um direito humano fundamental e defende uma gestão voltada ao bem público e com ampla participação social.

Uma das principais missões das entidades defensoras do meio ambiente é alertar a população brasileira para que tomem conhecimento dos interesses envolvidos na privatização da água e não permitam que este bem público de uso comum do povo venha a cair nas mãos da iniciativa privada. O hidronegócio da privatização é uma tendência desastrosa de apropriação dos recursos naturais. No mundo todo há uma tendência de reversão nas privatizações da água, que se demonstraram ineficientes em função de um evidente conflito de interesses.

Neste ano, a ONU elegeu como prioridade “dar visibilidade ao invisível”, focando a proteção dos aquíferos subterrâneos. É uma iniciativa primordial e estratégica para a sustentabilidade hídrica, já que os aquíferos vêm sendo constantemente atingidos por contaminações decorrentes de atividades humanas como o uso de agrotóxicos.

Muita gente acha que a água não acaba, não é um recurso finito, mas não é bem assim. O Presidente do Instituto Brasileiro de Proteção Ambiental (PROAM), Carlos Bocuhy explica “ o volume de água na Terra é sempre o mesmo, mas ele nem sempre está disponível para as populações na quantidade e qualidade necessárias. É um recurso finito porque há desequilibro que levam a má distribuição de água. As mudanças climáticas alteram a pluviometria, as chuvas. Um exemplo é o sistema Cantareira, em São Paulo, que vem colapsando ano após ano, com menos água a cada temporada. Então, a disponibilidade hídrica em volume é sempre a mesma no planeta, mas ele perde em qualidade e disponibilidade para a sociedade”.

O crescimento de atividades agrícolas e industriais também é um problema, pois o uso está crescendo de forma exponencial com o mesmo volume de água na hidrosfera (toda a água existente no planeta seja líquida, sólida ou gasosa). Assim a água está disponível em menor quantidade e mais poluída, como no caso dos aquíferos subterrâneos.

Carlos Bocuhy também alerta para outro aspecto que tem influído na escassez de água: é o processo de desertificação de regiões do planeta. “A região metropolitana de São Paulo já passa por este processo. Na época do Jose de Anchieta chovia dia sim dia não, mas tudo depende da presença de florestas. O cerrado, no interior de São Paulo também passa por um processo de desertificação. Tudo isso demostra que as áreas produtoras de água estão diminuindo”, explica Bocuhy.

Outro fator que tende a piorar a oferta de água é que “ a Amazônia está cada vez mais fragilizada no seu potencial de transportar água continente adentro pelos rios voadores. Significa que nós vamos perder regularidade de chuvas. A consequência disto, prevista do IPCC (Painel Intergovernamental sobre Mudança do Clima) é que até 2100 a gente perde 85% da produtividade da sociedade por causa da falta d’água”, conclui o Presidente do Instituto Brasileiro de Proteção Ambiental.

O sinal vermelho já foi acionado pela ONU quando a entidade informou que um quinto das bacias hidrográficas do mundo passa por flutuações dramáticas e que 3 bilhões de pessoas convivem com a escassez e a poluição hídrica.

No Brasil, é necessário que a população esteja atenta e vigilante sobre os avanços dos interesses econômicos para desregrar a legislação nacional. O Projeto de Lei 4546/2021, em tramitação no Congresso Nacional, pretende alterar a Política Nacional de Recursos Hídricos, para instituir um “mercado de águas”.

Segundo Marcus Polignano, representante da sociedade civil e vice-presidente do Comitê de Bacia Hidrográfica do Rio São Francisco, em entrevista ao site O Eco, “a proposta foi elaborada de forma antidemocrática, uma vez que não passou por discussão em nenhuma instância dos Comitês de Bacias Hidrográficas e nem mesmo no Conselho Nacional de Recursos Hídricos, apresentando inconsistências técnicas e inseguranças jurídicas ao privilegiar o interesse privado em detrimento do interesse público”.

O Instituto Brasileiro de Proteção ao Meio Ambiente promove uma série de palestras sobre o tema até sexta-feira, 25/03. Para acompanhar entre no site na entidade.