Debate sobre contrarreforma espanhola encerra Seminário Jurídico
Na última mesa do 3º Seminário Jurídico Nacional da Confederação Nacional dos Trabalhadores do Ramo Financeiro (Contraf-CUT), na tarde desta sexta-feira (31), o tema em debate foi a contrarreforma trabalhista na Espanha, com o professor de Direito do Trabalho e Seguridade Social da Universidad de Vigo, Jaime Cabeza Pereiro.
O evento começou na quinta (30) e foi realizado na sede do Sindicato dos Bancários de São Paulo, Osasco e Região, com transmissão por plataforma digital para o Comando Nacional dos Bancários, sindicatos e federações.
O secretário de Assuntos Jurídicos da Contraf-CUT, Lourival Rodrigues da Silva, comentou que “todos os temas tratados aqui tocam não apenas a nós, trabalhadores do ramo financeiro, mas a toda a classe trabalhadora, e é importante entender que se trata de questões estruturais, em amplo debate pelo movimento sindical brasileiro e também em âmbito mundial. Por isso, temos que avançar em nossas lutas locais, mas também promover o intercâmbio com experiências de outros países. O Seminário alcançou seus objetivos”.
Contrarreforma espanhola
As experiências de reversão dos prejuízos causados pela reforma trabalhista realizada na Espanha em 2012, com inspirações liberais, pela contrarreforma trabalhista de 2021, já sob um governo de esquerda, foram o pano de fundo para o primeiro debate da tarde desta sexta-feira.
“Trazer as experiências desta contrarreforma espanhola é fundamental para nós aqui no Brasil. Aqui também somos vítimas de uma reforma trabalhista que trouxe diversos prejuízos para a classe trabalhadora e para o desenvolvimento de uma sociedade mais justa e solidária”, explicou Lourival Rodrigues.
O convidado foi o professor de Direito da Universidade de Vigo, na Espanha, Jaime Cabeza, que começou justamente dizendo que a reforma trabalhista realizada na Espanha em 2021 ocorreu em um contexto semelhante ao que vivemos no Brasil, uma vez que foi realizada por um governo de esquerda para melhorar alguns aspectos em favor da classe trabalhadora logo após um governo conservador de direita ter estado no comando do país.
“A reforma de 2012 havia dado mais importância aos acordos diretos com as empresas e os acordos coletivos setoriais tinham perdido poder, assim como as entidades sindicais”, disse o professor, ao ressaltar que a Espanha passou a ser o país europeu com o maior número de trabalhadores com contrato temporário e um grande número de terceirizados, além da alta taxa de desemprego, pois a reforma facilitou as demissões, uma vez que reduziu os custos para as empresas que as realizava, às custas do corte de direitos trabalhistas.
A reforma de 2012 impedia que se estabelecesse um contrato temporário na sequência do encerramento de outro. Era preciso aguardar um período de 18 meses para uma nova contratação temporária do trabalhador. Neste intervalo o trabalhador ficava desempregado.
A reforma de 2021, pelo governo de esquerda, precisava reverter os prejuízos causados aos trabalhadores. Mas, segundo o professor, os grandes assuntos não passaram pela reforma. “Historicamente as reformas do partido popular, de direita, têm sido impostas, sem negociação com os sindicatos. Quando há um governo socialista, há um pacto de que as reformas sejam acordadas com a sociedade. Mas, esta reforma precisou ser pactuada e como consequência ela foi uma reforma moderada”, disse, ao acrescentar que existem críticas à reforma, com apelos de que ela precisava ter sido mais radical, para beneficiar mais aos trabalhadores.
“Como a reforma foi pactuada, em caso de uma volta da direita ao poder, é mais difícil que haja mudanças nesta reforma, uma vez que ela foi realizada com acordos com setores mais moderados”, disse. Mas, mesmo sendo uma reforma moderada, o professor avalia que as medidas têm produzido efeito, com queda dos contratos temporários de trabalho e aumento dos contratos efetivos.
Negociação coletiva
A negociação coletiva também teve destaque no dia. Foi pontuado que o movimento sindical deve se colocar como um ator consciente do ambiente político, como forma de exercer plenamente sua força na luta por seus direitos.
A ampliação da força do trabalhador nas negociações também foi discutida a partir de outras medidas, como a ação conjunta dos sindicatos, inclusive com presença dos movimentos sociais, o reconhecimento de suas eventuais fraquezas e a busca de adoção de valores atuais, como a inclusão da diversidade na pauta de reivindicações.
Esses pontos são vistos como vitais para negociação coletiva, que ficaram ainda mais necessários desde 2017, pois a Reforma Trabalhista inverteu a lógica anterior, dando à negociação individual mais peso que a coletiva, que se sobrepõe à Convenção Coletiva, que, por sua vez, supera a lei.
Mobilização já
Para a presidenta da Contraf-CUT e vice-presidenta da CUT, Juvandia Moreira, o movimento sindical continuará, neste começo de governo, a se debruçar sobre os temas do interesse da classe trabalhadora, como a questão dos trabalhadores por aplicativos, a reforma fiscal, o orçamento e a atualização do projeto sindical. “São debates estratégicos, para se saber quais passos vamos dar mais adiante”, disse. “É importante fazer essas mudanças, porque manter o sistema sindical como está é um grande retrocesso. Então, vamos trabalhar por essas mudanças agora, pois depois do primeiro semestre o mundo político vai se dedicar a outros temas. Essa é a prioridade da CUT e da Contraf-CUT”, garantiu.
A dirigente também ressaltou a importância da luta coletiva dos sindicatos. “Foi só com a negociação coletiva, por exemplo, que a categoria bancária, com sua força, conseguiu incluir na Convenção Coletiva de Trabalho (CCT) de 2022 uma cláusula sobre teletrabalho, que versa sobre jornada, saúde, desconexão e ajuda de custo, entre outros pontos fundamentais”, afirmou. “Somos a única categoria que conquistou uma cláusula sobre a modalidade. Foi uma quebra de braço muito grande, mas só conseguimos com muito trabalho e negociação coletiva”, concluiu.
Debates anteriores
Na quinta (30), primeiro dia do Seminário, as propostas das centrais sindicais para a contrarreforma trabalhista brasileira, com o assessor jurídico da CUT, José Eymard, e o sociólogo e ex-diretor técnico do Dieese, Clemente Ganz Lúcio. A organização sindical do ramo financeiro foi o outro tema, com a participação da secretária de Organização do Ramo Financeiro e Política Sindical da Contraf-CUT, Magaly Fagundes.
Na manhã desta sexta (30), o tema em pauta foi a inteligência artificial, suas limitações técnicas e éticas na sociedade e no mundo do trabalho, com apresentações de Paulo Rená da Silva Santarém, doutorando em Direito na Universidade de Brasília, que atuou como gestor da elaboração do marco civil da Internet no Ministério da Justiça, e a participação do advogado Nilo da Cunha Jamardo Beiro, sócio-fundador de LBS Advogados.
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